sábado, 26 de abril de 2008

SÉRIE - AS CIDADES DAS EMOÇÕES


Lembras-te?


Lisboa, Convento do Carmo
Acrílico sobre tela 60x70cm

Dulce, a minha primeira obra-prima

Era uma vez um sábado à tarde de um dia de Verão, com aquele céu azul de que só os pintores não gostam: sabem que, por muito que tentem, a realidade suplanta sempre a sua obra! Saímos de casa, eu, a minha mulher e as nossas duas filhas, Elsa de cinco anos e Dulce de seis anos, e atravessámos a ponte 25 de Abril, com destino ao Parque Eduardo VII, em Lisboa. A minha mulher tinha nessa tarde uma reunião. Ficou combinado que, enquanto ela ia cumprir uma árdua missão de trabalho, eu iria ficar com as crianças a brincar no parque! Mulher sofre! Como eu estava enganado...
Num primeiro momento, o Paraíso: crianças (eu incluído) a jogarem às escondidas, gargalhadas joviais, o prazer da descoberta em cada gesto, em cada corrida...
De repente, Elsa começa a chorar, a chorar, a chorar... Dulce, oferece-lhe tudo o que tem. O que não tem, inventa – um passarinho azul na mão, no jardim rouba flores de todas as cores... Eu faço o pino, subo às árvores, guincho como um macaco, grito como Tarzan... O choro sempre a aumentar! Dulce, a fazer beicinho, vai dizendo: “Bebé não chora, bebé não chora!”. Em três horas pode ter-se uma boa noção do que é o Inferno!
O grande drama, sabem qual foi? Não havia telemóveis, porque quando a minha mulher chegou, Elsa calou-se! Just like that!
Até hoje ainda não arranjámos explicação para o acontecido!
A minha filha mais nova formou-se em Marketing e Publicidade. Eu não tive nenhuma influência na sua opção: na altura, eu era Group Product Manager, no Marketing da Colgate-Palmolive Portuguesa. Pronto, se calhar tive um bocadinho de responsabilidade...
A minha filha mais velha, Dulce de seu nome (como era o da minha mãe), formou-se na Fundação Ricardo Espírito Santo e, no Instituto Piaget, tirou a licenciatura para Professora de Ensino Básico, variante de Educação Visual e Tecnológica, com a média de 17 valores, estágio 18 valores. Não é uma média fabulosa? Actualmente, está a dar aulas de EVT. Não tive nada a ver com essa opção: na altura ainda não pintava! Limitava-me a fazer uns bonecos para elas se rirem!
Esta minha filha já nasceu assim talentosa. No dia de dos meus anos, ofereceu-me este desenho como prenda. Aquele cabeludo, sou eu a treinar na mesa de bilhar que tinha em casa, porque jogava no Sport Lisboa e Benfica, e ela está a oferecer-me os chocolates de que eu tanto gosto. Na cabeceira da cama, tenho outro desenho lindo, que ela fez a partir duma fotografia, com o seu retrato e o da irmã.
E sabem uma coisa? Apesar de tudo o que está a acontecer com a Escola e o ensino em Portugal, ela não admite outra hipótese: quer ser professora!
O seu indomável espírito, foi buscá-lo, não tenho dúvida, aos genes da mãe.
Para o bem e para o mal, o seu gosto artístico e o masoquismo, só podem ser meus...

26 comentários:

Anne M. Moor disse...

Estou aqui a rir, imaginando o teu desespero ao ouvir a Dulce chorar e não saber o que fazer!!!! Agora, quanto ao masoquismo por ela ter escolhido ser professora, compartilho dela dessa paixão! Ser professor (a) é do que há de maravilhoso - ver o brilho nos olhos das crianças e adolescentes no relampejo de compreensão, de descoberta... António, não sabes como é bom poder fazer uma diferença na vida deles...
Beijos sem masoquismo

Estudo Geral disse...

Pois é, meu amigo, dizem que quando a árvore é boa dá frutos sãos... e eu acredito.

Está tudo muito bonito: a leveza do bailado clássico mais os seus voadores aprendizes, as (tuas) cidades eternas desta vez traduzida na nossa querida "menina e moça", como diz o Carlos do Carmo, mais a tua deslumbrante primeira obra prima "com firma reconhecida e assinado por baixo" (...), em palavras do Vinicius de Moraes (aproveito e mando um beijinho para a Dulce).

Ontem fui ao cinema. Em resultado acabei por publicar no meu blogue revista o teu "Pássaro Azul" acompanhado do poema que lhe deu origem. A partir de agora fazem-se também acompanhar por uma musiquinha que se lhes juntou.

Deixo-te um desafio: depois de passares por lá adivinhares o filme que fui ver.

d´Agolada disse...

Ola, grazas polo comentario no meu blog, grazas a el coñecinte, algo do que me aledo, tes un blog moi interesante, encantanme os cadros, ei voltar maís veces. Veño comentarche o que ti me dicias no meu blog. O de pedir desculpas por escribir en galego non era tal cousa, simplemente lle dicía que se non entendía ben, que lle axudaba ca traducción, nada máis, non creo que teña que pedir desculpas por escribir no meu idioma, non cres? Bueno, todo aclarado, eu tamén te entendo sen problemas, unha aperta.

A.Tapadinhas disse...

Tu não podes imaginar o meu esforço para estancar aquela corrente de lágrimas: teve tanto de homérico como de inócuo. No entanto, a simples presença da fada do lar, foi suficiente. São assim as mulheres: forças da natureza! Já tenho feito acções de pintura dedicadas às crianças, com os Rotários: julgo que me dá uma noção do brilho incomparável que descreves.
Beijo brilhante.
António

A.Tapadinhas disse...

O pior é quando a árvore é eucalipto... :)
A Dulce levou mesmo a sério o bailado. Uma professora dela quis levá-la para a Gulbenkian...
Vou passar pelo teu blogue por para ouvir a música no seu contexto original.
Quanto ao filme não é muito difícil. Atendendo ao enquadramento, não preciso de ir colher mais pistas. Na primeira oportunidade, eu também quero
vê-lo:
"O amor nos tempos de cólera"
Abraço.
António

A.Tapadinhas disse...

D´agolada: Não sei se sabes que muito recentemente
"na Assembleia da República de Portugal, em Lisboa, teve lugar uma Conferência Internacional sobre o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, com participaçóm de representantes dos diferentes países que no mundo têm como oficial a nossa língua. Por primeira vez, de maneira oficial, os portugueses convidaram a participar a directivos galegos da entidade reintegracionista AGAL. A que, com verdadeiro altruísmo, abriu a representaçóm a outras entidades, como a Associaçóm Cultural Pro Academia Galega da Língua Portuguesa, recentemente constituída, a Associaçóm de Amizade Galiza-Portugal, o Movimento Defesa da Língua e a ASPGP, criada no ano 1978 e presidida por quem suscreve este artigo. Ente outros alí estiveram Alexandre Banhos e Isaac Estraviz, presidente e vice-presidente, respeitivamente, da Associaçóm Galega da Língua. Também Ângelo Cristovao, Xavier Vilhar Trilho, José-Martinho Montero Santalha, Margarida Martíns, Concha Roussia e Manuela Ribeira. Banhos e Cristovao apresentaram sendos relatórios sobre a importância que tem a presença da Galiza, berço da lusofonia, na conferência, comunicando a adesóm de todas as entidades reintegracionistas ao futuro acordo ortográfico." Estas palavras foram publicadas no blogue colectivo "nova águia" a que podes aceder se te interessar o assunto.
Abraço fraternal.
António

Gi disse...

Semeaste os frutos que colheste ...

Que crónica deliciosa , quanto amor e ternura não vão para aqui, pai babado :). Já era sssim que te "via" , hoje tirei a prova dos nove :)

um beijinho e resto de bom domingo




PS - Foste colega do Luís Alexandre na Golgate?

A.Tapadinhas disse...

Gi: Foi um bom domingo como me desejaste. Em contrapartida, espero que tenhas uma boa semana.
Não conheci o Luís Alexandre...
Já saí da Colgate há quase 15 anos.
Beijo.
António

jorge disse...

¿No viste en tu hija la inclinacion de tu hija Dulce por la enseñanza?
¿Todas las estratagemas que fue capaz de inventar para tratar que su hermana dejara de llorar?

Con personas que eligen la educacion porque les gusta y no como refugio es como se puede conseguir arreglar esta parcela fundamental en cualquier nacion: La enseñanza de los jovenes.

Estoy con GI, cada uno recoge lo que ha sembrado.

Pena disse...

Estimado Amigo "António":

Brilhante vídeo perante a histária das suas brilhantes filhas: Elsa e Dulce.
Sem querer imíscuir-me como algo de bom conselheiro ou pretensões a tal, creio que o choro da sua pequenina filha Elsa, se ficou a dever a saudades de uma mãe preciosa que tem o carinho peculiar e único da Humanidade inteira. Abarca-a e sente-a em si e no que é. (Ou não?).
EVT é uma disciplina fascinante e 18 valores no estágio é obra. Vê-se que vai ter o talento do pai.
Um Post sensível e doce como só você, meu amigo, consegue conceber.
Diferente daqueles a que nos habitou e que surpreende pela riquexa existencial familiar.
Gostei de ler, acredite?
Deu um bocado de si de uma forma muito bonita.
Abraço amigo de estima e muito respeito
Sempre a admirá-lo

pena

A.Tapadinhas disse...

Jorge: Agora que falas nisso, acho que tens razão. Houve muitos indícios dessa sua tendência... Só me convenci que ela queria ser professora, quando deixou de parte algumas boas hipóteses de carreira profissional...
Todos nós conhecemos casos em que uma boa sementeira é estragada por motivos fortuitos. Não deixa de ser consolador pensar que as recompensas, às vezes, são imediatas: não precisamos esperar pela nossa entrada no céu para sermos felizes. :)
Abraço.
António

A.Tapadinhas disse...

Amigo Pena: Não me posso esquecer de dar o devido valor às suas palavras: são de um educador que por "acaso" também é professor, e que acumula com um grande e compreensivo coração.
Abraço.
António

Isabel disse...

Me parece estupendo que quiera ser profesora. Trabajo duro, desde luego, pero muy gratificante. Besos.
http://senderosintrincados.blogspot.com

Fernanda Irene disse...

Querido António, mi madre siempre dice que la naturaleza es sabia y por eso solo tienen hijos los jóvenes. Realmente hay que tener mucha fuerza y energía para criarlos. No quiero ni pensar cuántas noches en vela, cuanto trabajo para educarlos, ayudarlos con sus estudios, protegerlos, aconsejarles... Ellos son nuestra mejor obra sin duda.

Besos

ana disse...

Tienes que estar muy orgulloso de ellas, y ellas de ti.
Lisboa de las emociones, en cada esquina una emoción, una en el parque, otra en las aceras, otras en las casas, y muchas en el corazón de las personas abiertas a ellas, como el tuyo.
Un beso Antonio.
ana.

A.Tapadinhas disse...

Isabel: Quem corre por gosto não cansa... é este o caso: trabalho duro, mal recompensado materialmente, mas com outras compensações que são muito importantes...
Beijo.
Antóni

A.Tapadinhas disse...

Fermina Daza: É verdade que cada vez mais tarde, os nossos filhos se podem tornar independentes, devido a diversos condicionamentos
materiais, mais do que emocionais. Para esse acompanhamento é necessário uma grande disponibilidade: por isso os casais cada vez mais tarde têm os filhos. Temos de viver com esta realidade...
Beijo.
António

A.Tapadinhas disse...

Ana: Em cada esquina um amigo, ainda é uma realidade em Portugal, apesar do mundo estar cada vez mais perigoso.
Beijo.
António

Fay van Gelder disse...

Olá amigo António,
Adorei ler-te tão jovial e querido que o menino é :)

Parabéns ao pai querido e ás filhotas :)

Bjocas Coloridas e sem qualquer intenção de "roubar" as cores dos quadros tão lindos e coloridos - Há cores para todos :))))

RosaMaría disse...

Hermoso post, las niñas tienen padres sensibles y no es de extrañar que sean tan inteligentes y sepan lo que quieren. Besos

A.Tapadinhas disse...

Miss: Já vi que insiste em fazer-me concorrência: perdoo-lhe porque é uma simpatia comigo e, sobretudo, com as minhas meninas...
:)

A.Tapadinhas disse...

Rosamaria: Algumas vezes, apesar dos nossos esforços as coisas não correm bem. Felizmente, não foi este o caso...
Beijo.
António

asbeirasdoarnego disse...

Encantoume o teu blog, acabote de coñecer a través de d´Agolada, a min encantanme os cadros, sobre todo os de Miró, ademais teño que recoñecer que é un mosteiro ben bonito. Un Saudo. Volverei por aquí.
www.asbeirasdoarnego.blogspot.com

A.Tapadinhas disse...

asbeirasdoarnego: Bem-vindo ao meu blog que é "às beiras do Tejo". Vou a seguir visitar-te. Volta sempre que quiseres!
Abraço.
António

dulce disse...

Que surpresa!
Que giro ver agora (passado vinte e...anos) este desenho!
Lembro-me de o ter desenhado e pintado. É muito interessante, agora com olhos de professora, analisar e interpretar este desenho...
O passeio ao parque Eduardo Sétimo fáz também parte do meu imaginário.
OBRIGADA Pai, por todos os momentos inesquéciveis que passámos e passamos juntos.
É um privilégio ser a tua primeira obra prima!
Beijo grande
Dulce

A.Tapadinhas disse...

Sôtora Dulce: Acho que não consegue analisar com imparcialidade o desenho. Mas eu cumpro essa missão por si!
A colocação dos diversos elementos, no espaço, está perfeita. A perspectiva está calculada ao milímetro. A proporção das figuras, e a sua relação com os objectos que compõem a cena, estão dentro da proporção divina, como lhe chamavam os gregos, que apesar de não saberem a sua base matemática a utilizavam, porque a arte baseada nesse rectângulo dourado, resultava em obras-primas, como por exemplo, o Parténon. A menina que fez o desenho, tal como os gregos, não sabia ainda dessas coisas da matemática, mas a sua intuição artística superava a falta de conhecimentos técnicos. E essa pequenita genial é minha filha e está a transmitir às novas gerações os conhecimentos necessários para que a Arte contribua para a sua felicidade.
Para a minha, já contribuiste o suficiente, só por seres tão especial.
Que a Arte te acompanhe durante toda a tua vida: serás feliz e trarás a felicidade aos que contigo se cruzarem.
Sou um privilegiado!
Beijos para a filhota.