segunda-feira, 31 de março de 2008
FADO, MALHOA E O QUE MAIS ADIANTE SE VERÁ...
Vai um copo?
Acrílico sobre tela 100x120cm
Fado, Malhoa e o que mais adiante se verá...
Estava a jantar com minha mulher,
algo que não faço tantas vezes como devia
num restaurante de que eu gosto muito, porque para além da excelente qualidade da comida,
o que por si só, já seria um bom motivo para o frequentar
também aprecio o bom gosto das telas expostas,
são todas minhas
quando o meu amigo Bernardo, dono do restaurante,
curiosamente, quando estive no Rio de Janeiro, fiz questão de passar um dia na “Ilha do Bernardo”, para lhe trazer uma lembrança da “sua” ilha
me pediu para atender um senhor, construtor civil, que queria fazer-me um pedido.
normalmente é para ver se eu concedo um desconto nalguma obra exposta
Acedi, sem grande esperança. Afinal, estava redondamente enganado com as suas intenções!
acontece aos melhores!
O senhor queria que eu lhe fizesse uma tela, grande,
grande – substantivo, não, grande – adjectivo
para colocar na adega da sua casa, que seria inaugurada dentro de alguns meses. Quando comecei a dar a desculpa habitual para me esquivar a aceitar compromissos,
estilo: “Não tenho tempo! Estou muito ocupado”
o senhor não quis ouvir as minhas razões
era construtor civil, lembram-se?
e disse-me que até tinha ideia do que queria. Aí eu fiquei atento!
construtor civil com ideias, coisa estranha!
Queria que eu fizesse um quadro ao estilo de Malhoa,
José Malhoa, pintor português, naturalista, 1855-1933
com aquela conhecidíssima figura da sua obra “Festejando o S. Martinho”.
repetida em reproduções baratas, ad nauseum
Achei um bom desafio: não tinha muita paciência para pintar como Malhoa,
à data da sua morte o seu estilo já era contestado pelos mais novos
mas como também não tinha dinheiro, resolvi aceitar a encomenda.
mal como se verá!
Para não fazer uma cópia do óbvio, resolvi criar uma composição com duas obras de Malhoa e seleccionar cartazes da época
para o meu ego não ficar muito ferido
para pregar nas paredes da tasca onde se iria passar a cena.
Triste!
Para dar algum realismo às paredes, adicionei areia à tinta,
as pintinhas, suponho que parecem aquelas coisas que as moscas deixam nas paredes
e o claro-escuro do interior, mais escuro ainda, como é costume para ouvir os acordes plangentes da guitarra e os sons maviosos do cantor de fado.
e ninguém notar se quisermos dormir uma soneca!
Quando a obra ficou pronta, combinei com o meu amigo Bernardo, colocá-la no restaurante e o senhor construtor passar por lá para a poder apreciar em todo o seu esplendor. Adorou-a! Mas
há sempre um mas
não lhe convinha fazer mais despesas, naquela altura!
a crise toca a todos, não é? Menos aos pintores, acho eu...
E assim fiquei com uma obra que está exposta no “Restaurante Napolitano” do meu amigo Bernardo.
acreditam que já foi mandada guardar por um senhor que teve de sair para os Açores?
Até hoje!
sexta-feira, 28 de março de 2008
JANELAS DE LUZ
Janelas de Luz
Acrílico sobre tela 55x25cm
Lápis e marcador sobre papel
Fuga para o vermelho
Acrílico sobre tela 55x25cm
Marcador sobre papel
Estas duas telas foram criadas a partir de esboços que eu faço e guardo mas que na sua maior parte, nunca chegam a ser utilizados. Queria pintar só “Janelas de luz”, mas como gostei do resultado, aproveitei a embalagem e acabei por aproveitar os dois. Guardei notas das diversas fases da sua execução, que continuam bem presentes no meu espírito: Algumas das combinações de cores e contrastes, serviram para a realização da “Web”! Sem estas, a obra que dediquei a todos os meus amigos, não teria sido possível: Seria outra coisa completamente diferente.
Em cada peça que realizamos, está um pouco daquilo que aprendemos ao longo da nossa vida. No entanto, digo, como Picasso: Se sabemos exactamente o que vamos fazer, para quê fazê-lo?
Uma obra de arte bem preparada tem todas as condições para cumprir a sua função. Como um terreno, para ter um monumento. Mas existe um problema: é preciso fazê-lo...
Faço, logo existo!
segunda-feira, 24 de março de 2008
PRAIA DA LUZ
Praia da Luz Óleo sobre tela 70x90cm
Durante muitos anos, as férias da família Tapadinhas e da família Simplício foram passadas na Praia da Luz, aquela que ficou tristemente célebre com o desaparecimento da pequena Maddie McCan... A Praia da Luz de agora, não tem muito a ver com a que fez as nossas delícias e dos nossos filhos – estávamos no início dos anos oitenta. Qualquer semelhança com a realidade actual, é pura coincidência.
Já revisitei os locais que permanecem na minha memória... Infelizmente, não há qualquer correspondência com a situação actual: desapareceram os campos de cultivo e as pastagens onde passávamos algumas manhãs a apanhar caracóis, os aldeamentos turísticos afogaram as poucas casas tradicionais que restam, os pescadores são agora empregados da indústria hoteleira, os pastores e os agricultores são trabalhadores da construção civil e os seus filhos vendem apartamentos em time-sharing...
Sobre a fundação da povoação da Luz existem documentos que indicam o ano de 1673. A casa onde passávamos as férias, não era dessa altura mas tinha todos os sinais de antiguidade que tornavam cada ano de férias um acontecimento marcante na vida de todos nós, até hoje...
Um dia, a rever fotografias dessa época, resolvi fazer uma tela que registasse esses tempos, tão longínquos, como o dos dinossáurios – porque não voltam mais...
Escolhi, para lhe dar um sabor de época, a técnica do divisionismo ou pontilismo, assim chamada por derivar de pequenos pontos de cor pura, deixando que seja a retina do observador que faça a sua mistura para obter as imagens coloridas. Numa pincelada vermelha com fundo branco o pintor tem de ter em conta que esse branco é tingido com a sua cor complementar: o verde. No caso do amarelo será o violeta; no caso do azul o laranja. As cores atingem a sua máxima intensidade quando ao lado das suas complementares, segundo a lei do contraste.
Sabem onde está esta obra?
Adivinharam: em casa dos meus amigos. Está linda e não está só: tem por companhia outra com a qual faz um contraste absolutamente arrepiante...
Eu depois mostro, prometo.
quarta-feira, 19 de março de 2008
SENHOR JESUS DAS CHAGAS
Procissão Senhor Jesus das Chagas
Óleo sobre tela 80X70cm
Procissão
Recebi a chamada de uma amiga que me pediu para colaborar na angariação de fundos, para a Misericórdia do Barreiro. A sua ideia era organizar, com quadros doados por um vasto leque de artistas, uma exposição de pintura com uma característica especial: Todos os quadros teriam o mesmo preço, independentemente do seu valor comercial, ou da notoriedade do pintor. Concordei com o pedido e acertei a data da entrega.
Seleccionar uma obra para doação é menos complicado do que avaliar professores...
Quando percorri mentalmente as que tinha em casa e que eu considerava concluídas, lembrei-me, quase de imediato, da solução perfeita para o problema: Tinha recentemente dado por acabado um trabalho que tomou conta de mim, seguindo um caminho que eu nunca tinha imaginado. Passo a contar:
Num belo Domingo de Abril, acho que foi a 16, data do meu casamento, fui com a família às tradicionais festas de Sesimbra.
Era dia de procissão e quando passou o andor com a imagem do Senhor Jesus das Chagas, fiquei impressionado: A imagem do Senhor, de alguma maneira falou comigo. Não era minha intenção mas acompanhei durante algum tempo a procissão, para tirar fotografias.
Quando finalmente tive as fotos em meu poder, o maior problema foi seleccionar aquela que seria melhor para a tela que tinha projectado. Depois de um sem número de esboços acabei por me decidir por uma que cumpria algumas das premissas que tinha imposto: Cristo não podia olhar de frente, porque os olhos das imagens não têm beleza, mas tinha de estar em primeiro plano. Queria dar nota do envolvimento da multidão de devotos e das forças vivas que acompanham estas cerimónias. Feita a escolha, pus mãos à obra.
Não tive qualquer espécie de problema com o esboço que fiz. Tinha na minha memória, nítidas, as cores que queria plasmar na tela. Mas... as cores do Cristo na imagem, ficavam mortas, como as dos bonecos de barro, e eu não gostava do que via... A pouco e pouco, fui trazendo vida à imagem com as cores da carne palpitante e do
“sangue a gorgolejar das artérias abertas
pressuroso e vivo
como vermelhas minhocas despertas...”
Tanto realismo colocou Jesus de castigo no meu estúdio: Na minha casa todos ficavam impressionados com o Cristo sofredor e cabisbaixo... – Outra vez – pensei. Esta imagem, do século XVI, segundo a lenda, foi lançada ao mar pela mulher de Henrique VIII, quando da revolta dos anglicanos contra o papado, e recuperada perto do Cabo Espichel. Obra sobre um tema religioso, que não tinha grande futuro na minha casa.
Solução perfeita para uma oferta à Misericórdia, não acham?
No dia da inauguração da exposição, quando comecei a dar a volta para ver os quadros expostos, ao chegar ao meu, já tinha o sinal de vendido. Durante o beberete, a minha amiga apresentou-me a senhora que comprara a obra e que queria falar comigo. Depois das banalidades sociais da ocasião, a senhora disse-me:
– Quando entrei, vi imediatamente o Senhor Jesus das Chagas, de que sou muito devota. A expressão que lhe deu, apesar da sua situação, não revela sofrimento e traz-me muita paz e conforto. É por isso que o quero na minha casa – disse-me, com os olhos a brilhar.
A tristeza e o sofrimento do Senhor Jesus das Chagas, no meu lar, transformou-se, por milagre, em paz e conforto, na casa da devota senhora.
Feliz Páscoa para Todos!
segunda-feira, 17 de março de 2008
SÉRIE VILAS HISTÓRICAS - MOITA
Moita Junto ao Cais
Óleo sobre tela 50x70cm
Caldeira da Moita
Óleo sobre tela 45x55cm
(Ao fundo, por baixo do plátano mais à esquerda, estou eu a jogar xadrez com os meus amigos. Não liguem às cervejas em cima das mesas, porque o resultado dos jogos ali, ao ar livre, é o que menos interessa...)
Estas duas telas ilustram o local da Moita, que foi recentemente restituído à população com obras de fundo que visam reaproximar as populações ao seu rio Tejo.
Durante o período que permaneci no local para executar estas obras, aconteceram os normais contactos com os surpreendidos passeantes. Os mais interessantes resultaram dos alunos da escola próxima, que me interrogaram sobre diversos pormenores acerca das tintas e outros materiais utilizados. Um deles, com muita graça, perguntou-me se eu lhe dava uma ajuda para melhorar os seus trabalhos de Educação Visual.
Na minha entrada de 10 de Fevereiro, mostro as lamas e sapais onde as colónias de flamingos se alimentam dos macroinvertebrados (crustáceos, poliquetas, bivalves), durante a maré vazia.
Num passeio pela zona ribeirinha...
FLAMINGOS EM TERRA...
Já há muito tempo que não me acontecia: no dia 27 de Outubro, Domingo de mercado na Moita, tive um ataque de fúria.
Estava um dia lindo: um céu sem nuvens, um sol radioso com aquela temperatura e luminosidade, que só alguns dias de Outono, nos oferecem.
Resolvi ir ver pessoas e coisas ao mercado. Conduzi o automóvel para o amplo parque de estacionamento junto à Câmara da Moita. Chegaram dois arrumadores a discutir, com veemência, qual deles tinha direito à moeda virtual que eu possivelmente iria desembolsar. Nenhum deles tinha cartão e muito menos uma farda, que me permitisse resolver com justiça, tão acalorada demanda. Como não quis ser injusto paguei aos dois. Estava um dia lindo, lembram-se?
Enquanto caminhava lentamente pela marginal, admirava o batalhão de flamingos que, ao longo das margens do rio, filtravam os pequenos organismos que constituem a sua alimentação. A vida tem destas aparentes contradições: uma ave com formas tão elegantes, com cores tão belas, para se alimentar, passa o tempo com a cabeça mergulhada no lodo...
Cheguei à zona das primeiras tendas e bancas. O colorido habitual, mas sempre renovado para os meus olhos treinados a distinguir e registar novas combinações de cores, de luzes, de sombras...
De repente, a minha paz de espírito foi sacudida por um terramoto que abalou a minha comunhão com a Natureza, a minha confiança nos superiores destinos da Humanidade.
Frente ao lar “Abrigo do Tejo” está a escultura “Vento à Barra”, do artista banheirense Pedro Miranda da Silva, que homenageia a figura do marítimo na sua relação com o rio e com uma das suas mais belas e características embarcações – o Varino.
Nem o seu autor reconheceria a obra, submersa num mar de fios, cordas e cabos que a ligavam às tendas e árvores circundantes. Todas as reentrâncias, ângulos, protuberâncias e cavidades da escultura estavam preenchidos com mochilas, bonecos de plástico, cães de porcelana, roupas, canas de pesca.... A peanha do monumento estava atapetada (na verdadeira acepção da palavra), com tapetes e servia de bancada onde compradores e vendedores pousavam os couratos e as garrafas de cerveja, para apreciar os artigos expostos e concluir as suas transacções.
A Câmara da Moita dotou alguns espaços públicos com esculturas, num esforço louvável de aproximar a Arte das pessoas. Só que algumas dessas pessoas, na sua luta pela sobrevivência, na tentativa de obter resultados com o menor esforço, fazem como o flamingo: não vêem além do seu bico/nariz. Não temos nada com isso... desde que não impeçam outros de apreciar valores mais altos.
Mas, senhores... Então e os fiscais e as forças da ordem? Será que ficam a ver passar os flamingos?
quinta-feira, 13 de março de 2008
CAFÉ
Convite para um café
Carvão sobre papel Canson 40x50cm
- Quero uma bica!
Quase sempre, quando chego a um café, pastelaria, casa de chá, restaurante, bar, discoteca, tasca, cantina, taberna, e peço um café, ficam a olhar para mim com um olhar de enfado tão intenso que me dá vontade de cancelar o pedido e apresentar as minhas desculpas por ser tão ignorante.
- O café é normal?
E eu, obediente, respondo:
- Sim, é normal.
A minha frustração é que eu não queria responder. Se tivesse coragem para enfrentar uma acalorada discussão devia perguntar:
- Para si, o que é um café normal?
O empregado ficaria a olhar para mim, a pensar: “ Este gajo ou é estúpido todos os dias, ou tem a mania que é engraçado...” e diria o quê? À sua frente abria-se, de repente, um mundo de hipóteses, porque até para o café o conceito de normalidade varia com os locais e épocas.
Para um transalpino seria um pouco de espuma de café servido numa minúscula chávena bem aquecida, italiana, sem curvas, mas com muita espuma.
Para um americano, seria uma chávena, tipo balde, cheia até acima com um líquido acastanhado, a que eles curiosamente chamam “black”.
Se pedir um café em Espanha, trazem-lhe uma chávena de chá com um líquido castanho claro, obtido com uma mistura de café (?), água e leite, morna como a água do banho para o bebé. Para obter a bebida desejada é preciso pedir “café solo”.
No Porto, se pedir um café leva com uma chávena de café de saco e se protestar dizendo que é de máquina fica a saber que devia pedir “cimbalino”, nome obtido das primeiras máquinas que tiravam o café, cuja marca era “Cimbali”.
Para um turco, um café normal é uma chávena de chá cheia de borras de café, onde se vislumbra um líquido negro que se deve beber sem agitar as adormecidas borras.
Se pedir um café em Amsterdão, o normal é receber um café com natas. Para beber o que quer, terá de pedir “expresso”.
No Brasil não há café: só cafezinho. Depois de pedir, pode acontecer tudo o que eu disse para outros países...
...E é assim em toda a nossa vida: Pensar e agir “normal” é perigoso!
segunda-feira, 10 de março de 2008
EM ROMA, SÊ ROMANO
Mercado Jemaã El FnaTinta da China sobre papel 20x25
Sempre que visito um país, tiro apontamentos sobre os aspectos que mais me impressionam. Na minha terceira visita a Marrocos, fui finalmente a Marraquexe, a porta do deserto, e à praça que é o centro do mundo.
Em Roma, sê romano!
Parecia estar a atender o chamamento do muezim para a oração da noite: nesse momento estava a fechar a porta do quarto, onde deixara as malas, ansioso por sair dos portões do Club Med, que me isolava do mundo fervilhante de Marraquexe apenas entrevisto na pequena viagem de autocarro.
Antes de chegar à rua, já a cidade nos impõe o seu sortilégio: o barulho denso dos automóveis e motorizadas, e o bater ritmado dos cascos dos cavalos no asfalto martelam-nos os ouvidos; os cheiros dos gases de óleo e gasolina queimados, misturados com o odor mais consistente dos animais invadem-nos as narinas.
Na rua, a visão é do caos com uma só ordem: a desordem. Na avenida, larga como um campo de futebol sem marcações, circulam carruagens puxadas por parelhas de cavalos, carroças puxadas por burros, táxis, autocarros, motorizadas, bicicletas, todos a tentar fazer a ultrapassagem do vizinho da frente. Nesta competição, nem sempre ganha o mais forte: o automóvel mais moderno, arrisca-se a todo o momento a ser ultrapassado por um burro esperto, que consegue passar a carroça entre o intervalo dos carros. Nos poucos sinais que existem, quando cai o vermelho, os que estão na frente param - é esse o seu mal. Os que vêm atrás aproveitam e vão-se colocando sucessivamente à frente do que já parou. Os que estão junto ao sinal vêem aparecer o verde e reagem primeiro: ganham assim uns lugares na partida, ficando a corrida relançada, com hipóteses de vitória para todos.
Depois de andar algumas dezenas de metros, a confusão parece aumentar. Nós, peões, já não temos passeios e os motoristas parecem ter enlouquecido: não há rua, nem sentido de trânsito. Estamos na praça Jemaã El Fna, com superfície semelhante ao Terreiro do Paço, onde desaguam Tejos de ruas estreitas, de carros e pessoas.
Num dos lados, há uma muralha de tendas de comida, autêntica paleta de cores quentes: açafrão, caril, malaguetas, pimentos. Mais para o centro, a multidão ornamenta a praça em canteiros circulares de homens, que apreciam o trabalho dos ginastas em jogos de forças combinadas; alguns ouvem grupos musicais que tocam música tradicional, constituidos por um violino e dois ou três tambores; outros preferem rir-se das habilidades dos macacos amestrados a imitar pessoas; outros escutam, atentamente, alguém que diz não sei o quê, com grande convicção e energia; outros, ainda, gostam do terror atávico causado pelas serpentes que parecem dançar ao som do pífaro do seu encantador. Por entre os grupos andam homens de fatos encarnados e verdes, com pratos de metal amarelo, grandes chapéus na cabeça, a tocar em pequenos tambores, que oferecem a sua beleza para figurar numa fotografia, a troco de algumas moedas. Outros arranjaram uma estratégia mais simples para ganhar dinheiro: tocam um tamborzito, fazem uma careta e, se nem sempre provocam um sorriso, quase sempre arrancam uma moeda.
Metade da praça é disputada, a palmo, por peões, que tentam passar na terra de ninguém que a qualquer momento pode ser atravessada por um veículo vindo de qualquer ponto cardeal.
Estranhamente, não se ouve buzinar os automóveis: talvez o barulho dos motores, o bruá da multidão, os guinchos dos animais, o toque dos tambores, o silvar das serpentes, não o deixem ouvir, ou, com maior probalidade, o nosso cérebro se recuse a registar esse som, por mais habitual, dando prioridade a tudo o que é novo: cheiros, línguas, cores, gente, animais.
É difícil (impossível, direi), ser apenas espectador: logo que olhamos para alguma coisa, o vendedor atento, pergunta-nos a nacionalidade, e oferece o objecto, por um determinado preço. Ser português, neste caso, é uma vantagem, porque acham que nós somos pobres como eles. Conversamos, discutimos, num linguajar franco-anglo-luso-espanhol; quase nos insultamos, porque é assim nas grandes famílias. Depois de consumado o negócio, é assinado o tratado de paz. Por mim, apetece-me sempre abraçar o meu novo amigo, que teve a gentileza de vender um objecto por um preço tão acessível.
Ainda estava a fazer as contas com a minha esferográfica e já ele me estava a propor a sua troca por um espelhinho, com um aro de metal…
E tem sido assim todos os dias… mesmo no dia 11 de Setembro de 2001, nesta terra, não muito longe daquela que viu nascer três grandes religiões.
Nos escombros e trevas que a televisão teima em mostrar, há uma luz que ilumina e elimina o nosso terror: do outro lado, afinal, estão homens como nós.
Eu, agora, vou para o meu quarto e juro que vou pensar numa estratégia, para comprar pelo melhor preço um casaco de cabedal que vi numa loja.
Guerra, qual guerra?
sexta-feira, 7 de março de 2008
DIA INTERNACIONAL DA MULHER
Isto não é uma flor
Acrílico sobre papel Canson
Letras com caneta PITT artist pen Indian ink
No dia 8 de Março de 1857, as operárias têxteis de uma fábrica, que ganhavam um terço do salário dos homens, reivindicaram a redução de um horário de trabalho, de 16 para 10 horas, por dia. Foram encerradas na fábrica a que alguém lançou fogo. Morreram queimadas 130 mulheres. Num país asiático? Africano? Não! Isto aconteceu nos Estados unidos da América, na cidade de New York...
segunda-feira, 3 de março de 2008
AS DEUSAS DO AMOR
Três Girassóis Óleo sobre tela 50x40cm
Onze Girassóis Óleo sobre tela 73x60cm
As deusas do amor
Afrodite era a deusa grega do amor e da beleza. Usava um cinto mágico para ninguém resistir aos seu encantos...
Para mim, todas as amigas têm um “cinto” mágico que me aperta a garganta sempre que resolvem lançar-me os seus feitiços:
Ana, Anne, Gi, Irene, Isabel, Laura, Madalena, Miss Slim, Moony, Nocturna, Paula, She, Zulma...
Das deusas deste Olimpo quem despoletou a necessidade imperiosa de dedicar-lhes uma postagem, foi She...
Hoje de manhã avisou-me que Zulma (são ou não nomes de Deusas?), tinha uma prenda para mim e que ela iria reforçá-la... com mais feitiços: rosas mágicas do seu jardim... Mas, não me esqueci que Nocturna abriu um blog para colocar algumas das minhas obras, o que me deixou envergonhado como um colegial apanhado em falta (foi tão bom!), que Anne se serviu de uma obra minha para ilustrar um poema, ou que Irene já me informou que está a pensar utilizar-me num futuro trabalho...
Devo estar a esquecer-me de alguém, mas para compensar esta possível falta tenho um brinde que eu adoro: girassóis...
Não aceito protestos dos amigos. Estou mesmo a ouvir, Jorge ou Javier ou... a dizer:
- Então, e para mim não há nada?
Ao que eu respondo:
- Não irão perder pela demora, meus amigos!
Façam favor de tirar um girassol das obras que tenho expostas. Há uma curiosidade com estas flores. Já vos disse que tenho uma caturra que imita o meu assobio no hino nacional, na quinta sinfonia de Beethoven, no jingle bells, entre outras músicas. Ela come uma mistura de sementes. É muito temperamental, como todas as divas, e espalha-as por todo o lado. Recolho as sementes do chão e atiro-as para o terreno para que outras aves as aproveitem. Há uns anos atrás, duma dessas sementes, nasceu um espectacular girassol, com o qual fui gastando rolos e rolos de fotografias, de todos os ângulos e com todas as situações de sol e sombra. A obra com os três girassóis faz parte da minha colecção particular, porque foi feita directamente no local. E eu acho que não foi inocente o nascimento dessa flor no meu terreno: Van Gogh esteve lá a cuidar dele...
sábado, 1 de março de 2008
Cancao do Mar
Canção do Mar foi cantada por Amália Rodrigues em 1955. Dulce Pontes tem esta canção gravada no seu álbum "Lágrimas" de 1993.
ONDE A TERRA ACABA...
Onde a terra acaba e o mar começa...
Acrílico e óleo sobre tela colado sobre tela 70x80cm
Estava à procura de um tema para a postagem, quando me apareceu a foto de uma tela, feita de pormenores que fui seleccionando de experiências para obras futuras. Curiosamente, esta obra relaciona-se com a anterior: foi comprada numa exposição. Só mais tarde, fiquei a saber que tinham sido os meus amigos, quando me telefonaram a dizer (são uns brincalhões!) que se a quisesse voltar a ver, passasse lá por casa.
Desde então, tenho-me servido do pretexto de rever as obras para apreciar o belo Moscatel J. M. Fonseca que têm na sua garrafeira. E, para ser sincero, rever esta obra que está na parede defronte da lareira... para não voltar a falar de "Cenáculo"...
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